Seminário reúne representantes da região Norte para plano de combate e mitigação dos efeitos da seca na Amazônia
Os processos de mudanças climáticas chamaram atenção para um fator que há muitos anos os pesquisadores vêm alertando: A Amazônia está secando. Uma das formas de tentar mitigar esse problema é buscar experiências que estão dando certo, ouvir as comunidades e fazer um plano de ação. Por isso, a Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), campus Belém, sediará nesta terça-feira e quarta-feira, 14 e 15 de maio, o encontro regional sobre o 2° Programa de Ação Brasileiro de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAB).
O evento, que ocorrerá no Prédio Central da universidade, faz parte de uma série de outras atividades que acontecem em todo o país e que buscam reunir pessoas da sociedade civil organizada e do governo para discutir e analisar pontos importantes sobre o combate à desertificação e a mitigação dos efeitos da seca no país. A meta é que a partir desses encontros seja formulado o segundo PAB, válido para os próximos 20 anos.
A iniciativa é realizada por meio do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e, na região norte, é coordenada pela professora Vânia Neu, da Ufra. “Muitas vezes as pessoas pensam que o volume de água que temos aqui nunca vai acabar. Mas, ano passado mesmo, vimos que a água acabou. Várias regiões da Amazônia secaram, os rios secaram completamente, rios gigantes, lagos imensos secaram e muitas pessoas ficaram sem água para beber na região. Elas ficaram sem água e sem comida porque aqui na Amazônia os rios não são só fonte de água, mas eles são as estradas para chegar nas comunidades e essas comunidades ficaram isoladas. A Amazônia está em um processo de seca cada vez maior”, diz. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do ano de 2020, a seca já havia atingindo mais de 50% dos municípios brasileiros, o que faz ser um problema atual para o país.
Segundo a professora, o primeiro plano de ação brasileiro contra a desertificação foi realizado em 2004, e foi elaborado para a região da Caatinga, pois era onde se encontrava grande risco de desertificação e dos processos de seca. “Passados esses 20 anos, eles viram que os extremos climáticos realmente chegaram para ficar. Não bastava fazer um novo plano, com novas metas, se não fosse incluindo o resto do Brasil. Assim, eles resolveram fazer um novo plano, que é esse segundo plano, construído para os próximos 20 anos com todas as regiões”, diz.
O seminário
Durante o evento, vão ocorrer diversos momentos de interação e de dinâmicas e será apresentado um relatório diagnóstico da atual situação da Amazônia. Ainda que unidos na mesma região, os estados do Norte possuem características, costumes e vivências diferentes. Então, como reunir tantas amazônias apenas em um plano?
A partir da escuta e experiência sobre o que já deu certo. Ainda dentro da programação, serão expostas três experiências bem sucedidas, uma da iniciativa privada, uma da sociedade civil e outra do governo, que não fazem parte do PAB mas que vem acontecendo e auxiliando no processo de redução de seca, garantia da segurança alimentar e segurança hídrica. Na ocasião serão apresentadas três experiências exitosas, uma na esfera governamental (um projeto no nordeste paraense (programa Proambiente); iniciativa privada (um projeto de agricultura regenerativa em Breves, no Marajó) e por fim uma experiência da sociedade civil organizada (um projeto de restauração na agricultura familiar, em Rondônia).
A partir desses cases os representantes dos estados darão contribuições sobre o que funcionaria para a sua região, agregando experiências e formulando alternativas. "A ideia é que cada um venha e traga um pouco do seu território. As ações que vamos apresentar são pontos de partidas, ações que estão sendo feitas e que estão reduzindo o processo, que estão freando o processo de redução de seca, mantendo a segurança alimentar e a segurança hídrica também. Com base nessas experiências que já deram certo, nós vamos construir o nosso plano", diz a coordenadora.
Pelo menos 20 pessoas da sociedade civil organizada e 20 representantes de governo foram convidadas para comparecer ao evento, que é fechado e financiado pelo MMA. O resultado de todos os seminários do PAB serão apresentados ao Ministério, que reunirá todas as informações sobre as regiões a fim de construir o plano nacional, que será válido pelos próximos 20 anos. "A ideia é levar esse plano para a COP na Arábia Saudita, em dezembro, verificando a possibilidade de conseguirmos recurso internacional para implantar o que estamos propondo", finaliza.
Savanização
De acordo com a professora, na Amazônia o que ocorre não é a desertificação, mas a “savanização”, um processo de mudança da cobertura vegetal do bioma, com perda de árvores de grande porte, dando lugar espécies similiares ao que se encontra na região do Cerrado. Um dos assuntos a ser tratado nesses dois encontros é, justamente, o que pode ser feito para reduzir esse processo acelerado de savanização na região e como se adaptar aos efeitos das secas frequentes que estão ocorrendo nos últimos anos.
Vania Neu diz que o processo de seca em várias regiões da Amazônia tem vários motivos, mas um dos principais é o desmatamento. Sem árvores, sem chuva. "Para ter esse volume grande de chuva a gente tem que ter a árvore. É a árvore que faz chover. Para ter uma ideia, por dia cada árvore joga cerca de mil litros de vapor d’água para a atmosfera. E o que a gente vem observando ao longo dos anos é desmatamento, muito corte de árvores, o que gera menos umidade indo para a atmosfera. Menos umidade, menos chuva e, com menos chuva, consequentemente os rios vão secar. Essa é uma realidade que a gente vai enfrentar na Amazônia daqui para frente" lamenta.
Vania Neu diz que até então não víamos esse cenário com frequência porque a Amazônia ainda tinha uma grande cobertura florestal. "Agora, a gente já chegou a cerca de mais ou menos 20% de área desmatada. E nisso, a Amazônia vai começar a perder essa capacidade de formar tanta chuva, o que influencia não só para a gente aqui na região amazônica, mas para outras regiões do Brasil", diz.
Sobre o PAB
O Programa de Ação Brasileiro de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAB), busca identificar os aspectos que auxiliam o processo de desertificação e de seca no país e, assim, propor e planejar ações estratégicas de curto, médio e longo prazos que possam auxiliar a combater esse processo, mitigar os efeitos das secas e prevenir e reverter os quadros de degradação do solo. Através do programa, conseguir direcionar governos, comunidades locais e sociedade, sobre medidas práticas que podem ser feitas.
Em 2004, na sua primeira versão, o programa apresentou levantamentos de áreas suscetíveis à desertificação e ações que poderiam ser tomadas na região do Semiárido brasileiro, que abrange nove estados do Nordeste e o norte de Minas Gerais.
O 2° PAB é uma iniciativa desenvolvida por meio do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e conta com parceria de instituições públicas do país. Entre os o objetivos está: mapear as áreas suscetíveis e afetadas pelos processos de desertificação e seca no Brasil, permitindo a interação ativa com a população afetada; ampliar os espaços de diálogo no âmbito do PAB para explorar abordagens inovadoras na prevenção e combate à desertificação, mitigação dos efeitos das secas e recuperação de áreas degradadas; promover a articulação e mobilização de diversos setores da sociedade, integrando saberes populares e acadêmicos, para construir PAB por meio da discussão, compartilhamento e reflexão sobre conhecimentos, experiências e lições aprendidas no combate à desertificação e mitigação dos efeitos da seca.
Texto: Vanessa Monteiro e Júlia Marques (Ascom Ufra)
Texto editado às 20h38
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