Violência doméstica – saiba onde procurar ajuda
O período de isolamento necessário à contenção e prevenção do Covid-19 escancarou um problema grave e já conhecido por muitas mulheres: a violência doméstica. De acordo com dados divulgados pelo Ligue 180, canal de denúncias e de atendimento à mulher, desde o início do período de quarentena houve um aumento de 9% no número de ligações ao canal.
Para Daniela Castro dos Reis, doutora em psicologia e comportamento humano e professora da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) campus Parauapebas, em tempos de crise e isolamento, as mulheres e meninas continuam sendo as mais afetadas, especialmente as trabalhadoras informais e as que realizam serviço doméstico.
“Em contexto de emergência, os riscos de violência contra mulheres e meninas aumentam, especialmente a violência doméstica, com o aumento de tensões em casa e o isolamento das mulheres. As mulheres ainda tem que enfrentar obstáculos adicionais para fugir dessas situações de violência, como acessar os serviços de proteção que salvam vidas ou os serviços essenciais, pois enfrentam restrições de locomoção já que estão em quarentena. Há também os aspectos econômicos da pandemia, o que pode criar obstáculos adicionais, como a dificuldade em deixar um parceiro violento, e um aumento no risco à exploração sexual com fins comerciais. A segurança alimentar de mulheres e meninas também pode ser afetada por dificuldades no acesso a alimentos nutritivos e seguros, devido ao fechamento de serviços de alimentação nas escolas e comunidades, escassez de alimentos e restrições de locomoção, principalmente para uma sociedade em situação de vulnerabilidade social”
A pessoa vítima de violência pode solicitar ajuda na rede de proteção, promoção a atendimento associada ao Suas (Sistema único da Assistência Social); aos SGD (sistema de garantia de direito); e pode também ligar para o 180 (para violações contra mulher) e o Disque 100 (para casos de violações contra criança e idoso). Mas essa vitima ainda esbarra no medo e vergonha de denunciar o agressor. “Geralmente, a mulher se sente envergonhada por estar sofrendo a violência, pois pela ideologia machista e patriarcalista, a mulher sempre é culpabilizada pela violência sofrida, seja pela roupa que está vestindo, pelo comportamento, ou por qualquer ação dela. Como a sociedade ainda pensa dessa forma, ela sente-se inibida a denunciar, pois em alguns casos ela mesmo acredita que ela é a culpada pelo ato sofrido”.
Vizinhos e parentes podem ajudar a vítima, fazendo a denúncia aos canais de atendimento, como o 180 e ajudando a romper esse ciclo. Há vários comportamentos que ajudam a identificar que uma mulher está sofrendo violência, e alguns vão além de aspectos visíveis, como hematomas ou lesões. “Quando a natureza do ato é a agressão psicológica os comportamentos mais perceptíveis são a baixa autoestima, isolamento social, e em alguns casos cárcere privado. Além da agressão física e psicológica há a agressão sexual, patrimonial, institucional, social, obstétrica, entre outras. Geralmente, o fenômeno da violência doméstica é a soma de uma diversidade de agressões sofridas”, diz a pesquisadora.
A pesquisadora explica que a violência doméstica afeta todas as mulheres, pois “o fenômeno da violência é polissêmico, multifacetado e complexo em todas as sociedades, principalmente um sociedades patriarcalistas como no caso do Brasil”. E embora existam estudos que ajudem a identificar um perfil desse agressor, ainda não há consenso sobre o assunto. “Alguns indícios comportamentais ainda surgem no início dos relacionamentos afetivos, às vezes o autor de agressão começa a questionar um estilo de roupa que a mulher veste, um tipo de comportamento que ele não gosta, o controle de documentos pessoais, a chantagem emocional, impedimento à sua saída, controle de localização, entre outros. Uma das formas de orientação é tentar entender que tais comportamentos podem vir associados a uma declaração de amor ou justificativa de cuidado. Fica o alerta”.
SIS MULHER
Em parceria com a Prefeitura Municipal de Parauapebas (Secretaria da Mulher e Secretaria de Planejamento), a UFRA foi convidada a participar do plano de ação e atendimento à mulher, e as professoras Daniela Castro dos Reis e Josilene Ferreira Mendes iniciaram a concepção e a sistematização do Sis Mulher, um sistema de informação interno projetado para que os dados das mulheres que procurassem apoio municipal ficassem reunidos em um mesmo sistema. O objetivo é ajudar os técnicos nesse atendimento e não revitimizar as mulheres que buscassem ajuda.
O programa foi originado a partir do projeto “violência doméstica, um debate necessário”, organizado pelas docentes na universidade. Com o Sis Mulher, todos os dados de consultas e atendimentos ficam armazenados no mesmo perfil da mulher cadastrada, disponibilizando o acesso ao sistema jurídico, social, de saúde e assistência àquela mulher. “O objetivo é compreender quem é essa mulher, do que ela precisa, fazer essa análise e assim planejar e pensar em políticas públicas específicas que possam ser executadas pela prefeitura”, diz Daniela Castro dos Reis.
A iniciativa também incentivou a criação do projeto de pesquisa e extensão “Observatório de Gênero”, organizado pelas professoras, com o apoio de técnicos e alunos da universidade. As ações do observatório incluem rodas de conversa e oficinas com adolescentes da rede pública de ensino. “O objetivo não é apenas falar para a mulher, mas principalmente falar para o homem, porque ele é o principal agressor. Não temos como pensar em violência doméstica se não trabalharmos com o homem, e isso tem que acontecer desde a base, a partir da conscientização dos meninos, de não objetificar a mulher, de que não tem poder sobre elas”, diz a professora.
As discussões incluem temas que fazem parte do dia a dia adolescente, e com informações que eles recebem de mídias como o facebook e o whatsapp. “Nossa intenção é fazê-los repensar essas atitudes. É um trabalho de formiguinha. Mas a longo prazo nós vamos conseguir”, diz.
Em março desde ano o Ministério Público do Pará (MPPA) divulgou dados referentes a 2019 sobre os atendimentos feitos no órgão. Entre as informações destacadas é que 50% das vítimas declararam não possuir nenhuma renda, 87% dos casos acontece entre agressores que têm vínculo de afetividade/conjugalidade com a vítima e 13% algum vínculo de parentesco.
Como denunciar ou procurar ajudar (com informações dos sites do TJPA, DPE e ParáPaz):
- Para denunciar agressões, a vítima pode ligar para os telefones 180 ou 190
- Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) do seu município. Em Belém a Deam atende nos números: (91) 3246-6803 e 98915-1888. deampcpa@gmail.com e patrulhamariadapenhabelem@gmail.com
- A Defensoria Pública do Estado lançou o Espaço Virtual de Acolhimento (EVA) para mulheres em situação de violência, oferecendo orientação jurídica e psicossocial no âmbito familiar. A mulher preenche um formulário que é encaminhado ao Núcleo de Prevenção e Enfrentamento à Violência de Gênero (Nugen). O Núcleo também disponibiliza os seguintes números: (91) 99172-6296. Para atendimento ao homem, o número é (91) 3217-2342 / 2342. (www.defensoria.pa.def.br)
- Pará Paz Mulher: agrega no mesmo espaço físico o TJPA, Ministério Público do Pará (MPPA) e Defensoria Pública do Pará. Pará Paz Mulher (Belém): Travessa Mauriti, 2393, bairro do Marco. Funciona das 8h às 14h. Pará Paz Mulher (Ananindeua): TV We 31, nº 1112. Cidade Nova. Funciona das 8h às 16h. (www.propaz.pa.gov.br)
- Delegacia Virtual: www.delegaciavirtual.pa.gov.br
- Alô cidadão da Polícia Civil: 99991- 0009
Texto: Vanessa Monteiro, jornalista, Ascom UFRA
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